sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Um pouco da Ciência do Folclore

Temos aqui algumas considerações sobre o Folclore e o Festival de Folclore de Olímpia/SP



Este festival aborda muito bem as questões relacionas à educação ao turismo e à cultura tradicional e suas projeções, no contexto da homogeneidade cultural. Aponta a necessidade de se estabelecer uma promoção sócio-cultural, objetivando garantir a reprodução dos fatos folclóricos pela comunidade de Olímpia, dando continuidade de forma consistente a tudo que foi idealizado pelo mestre José San’tana, de saudosa memória, e projetar o Folclore ou Cultura Popular Brasileira de forma consciente e responsável numa sociedade emergente, conservando toda sua simbologia para uma saudável convivência num mundo em perspectiva, em busca de significados

Discutir todas essas relações é ressaltar a necessidade que o denominado patrimônio imaterial adquire no âmbito da gestão pública. Assistimos, nas últimas duas décadas do século passado, um aumento das preocupações em torno da problemática da preservação com sustentabilidade da Cultura Popular Brasileira, e isto é muito importante, animador para nós pesquisadores e defensores dessa rica diversidade cultural não existente em nenhum país. Por esta razão faz-se necessárias realizações como esta, com um pé na tradição e outro na modernidade sem ser diferente, mas, fazendo a diferença como esta bela, simpática, e inteligente cidade vem fazendo ao longo dos 45 anos de realização desse importantíssimo festival, contagiante e emocionante.

Dessa forma vocês estão contribuindo para o revigoramento das expressões culturais do nosso país, fortalecendo o caráter identitário, com a promoção e divulgação das mais belas expressões culturais Brasileiras.

Não podemos imaginar que um festival com quarenta e cinco anos de existência seja repetitivo. Os tempos mudam e as pessoas incorporam novos valores, novas cisões de mundo. É o dinamismo cultural. O homem ao contrário das formigas tem a capacidade de questionar seus próprios hábitos e modificá-los. Você me pergunta quais os pontos falhos e em que precisa melhorar. Uma ótima pergunta. Nas localidades “vocacionadas” para o turismo, como é o caso de Olímpia, é comum que grupos empresariais e instituições públicas apareçam na idealização de eventos turísticos. Espetáculos, shows de música popular, grupos folclóricos, banda e cantores nativos conferem visibilidade aos produtos culturais e aumentam a capacidade de atratividade. Tudo bem e normal, agora: muito cuidado com o mercado publicitário, pois a mídia, com raras exceções, é simplista, simplificadora na informação, cria simulacros que tendem a transformar em produtos que destroem a importância cultural do evento e da comunidade. Quando aceitamos as tendências midiáticas, limitamos a capacidade problematizadora e educadora da informação, diminuindo assim, a percepção da oferta informativa por parte dos visitantes ou mesmo dos habitantes da comunidade.

A cultura tradicional é o folclore, que nos dias atuais evolui com as mudanças na sociedade de consumo. Dessa forma, colocar o novo e o tradicional num mesmo espaço, dando-lhe a mesma importância e o devido respeito é o ideal, pois, eleva a auto-estima do homem do povo que na maioria das vezes não acredita mais e nem propaga sua vivência cultural, apenas assiste a tudo e à margem do processo, longe da mídia, cansado e desiludido, tende a desfalecer, o que leva ao desaparecimento de muitas das manifestações importantíssimas da tradição popular folclórica. Aqui no Rio Grande do Norte sou testemunho de fatos dessa natureza. O Brasil precisa mirar-se no exemplo de Olímpia, caso deseje preservar sua identidade e não ficar rendido no altar da globalização. É preciso saber avaliar a importância da tradição para o moderno, porque sem a tradição somos homens de mãos vazias. Esta é questão.

Primeiro devo dizer que o folclore é uma ciência, com seu objeto de estudo: “O fato folclórico”, apoiado na oralidade, tradicionalidade, dinamicidade e funcionalidade, são os pilares de sustentação desta moderna ciência. Sem esquecer que a oralidade, nos dias atuais, tende a aparecer como sentido simbólico.

Já os grupos de projeções, representados pelos autos e danças tradicionais folclóricas, tem integrantes que, em sua maioria, não são portadores das tradições apresentadas, se organizam formalmente e aprendem as danças através do estudo regular ou exclusivamente bibliográfico e de modo não espontâneo.

Racionalmente falando, o moderno e o tradicional podem e devem conviver harmoniosamente. A modernidade não vive sem a tradicionalidade porque, a modernidade é uma espécie de espelho cujos reflexos reproduzem as imagens do todo inacabado. Sempre vai existir um passado com reflexos no presente, com um futuro em perspectiva. A ciência do folclore e sua dinâmica é uma necessidade para compreender as interações presentes com este universo complexo e suas relações social e cultural num mundo em transformação para compreender o significado de sua presença em algum lugar e algum tempo.


Severino Vicente

Historiador e Folclorista.

Presidente da Comissão Norte-rio-grandense de Folclore

terça-feira, 1 de setembro de 2009

HOMENAGEM



A Comissão Norte-Rio-Grandese de Folclore e a Academia Norte-Rio-Grandense de Letras homenageiam o Mestre Folclorista Veríssimo de Melo.

A Escola Municipal Professor Veríssimo de Melo recebeu o Presidente da CNF, Severino Vicente e o Vice-Presidente Gutemberg Costa, junto com o Presidente ca Academia Norte-Rio-Grandense de Letras, Diógenes de Cunha Lima para uma conversa com os alunos, professores, funcionários e direção desta. Receberam uma moldura com a foto do patrono e algumas doações de livros para sua biblioteca.
Vale ressaltar que a idealização desta homenagem ao patrono da escola é da professora Ellaine Costa, constatando que a maioria dos alunos, alguns funcionários e até mesmo professores desconheciam a vida e obra de Veríssimo de Melo.



Homenagem e respeito ao falecimento do mestre do Folclore Potiguar

Treze anos sem o mestre Veríssimo de Melo

O saudoso amigo que na intimidade da amizade era chamado de ‘Vivi’, nasceu em Natal, terra abençoada por Padre João Maria e Câmara Cascudo, no dia 9 de julho de 1921 e veio a se encantar no dia 18 de agosto de 1996, mês dedicado mundialmente ao folclore. Sua grande paixão em vida, alicerçada nas lições cascudianas que o mesmo teve o privilégio de recebê-las em vida. Discípulo dileto do mestre da Junqueira Aires, como folclorista viajou quase todo o mundo, ora pesquisando, ora participando de seminários e congressos, como representante do RN e então presidente da nossa Comissão Norte-rio-grandense de Folclore.

Quando resolvi por curiosidade e teimosia pesquisar sobre o vasto mundo da cultura popular, diante da idade do mestre Cascudo, procurei logo por ajuda de livros emprestados e conselhos de Gumercindo Saraiva e Veríssimo de Melo. O primeiro reservou-me os sábados pela parte da tarde, com muita aula, conversa e vinho em sua casa. E quanto ao Vivi, este liberou todas as manhãs da semana para receber-me na sede da Academia de Letras. Com paciência ia me pedindo para anotar num caderno as principais obras sobre o folclore brasileiro, mas diante de minha dificuldade financeira em adquiri-las de pronto, disse-me em menos de um mês, entre um cafezinho e um trago do seu cigarro: “Vou te emprestar um livro de cada vez, pois quem leva dois ou três não volta para devolvê-los ao dono”. Após a publicação de seu livro sobre Tancredo Neves na Literatura de Cordel, deu-me quase todos os folhetos de sua pesquisa, com a desculpa e o incentivo profético: “Eu estou vendo seu interesse e sei que você um dia vai precisar para publicar uma obra sobre o Cordel”.

Às vezes quando o livro trazido de sua biblioteca era pouco volumoso, eu o lia em silêncio numa grande mesa do Conselho Estadual de Cultura, paginando-o e anotando e só sendo interrompido, quando o mestre Vivi, se aproximava com o convite: “Vamos dar uma paradinha meu jovem para uma água e um cafezinho”. Perdi a conta dos dias e dos livros, mas estão na memória seus conselhos e suas histórias sobre Cascudo, Zé Areia, Luís Tavares, Newton Navarro, Albimar Marinho, Roberto Freire e Cancão, entre outros intelectuais, boêmios e quixotescos personagens de seu convívio natalense. Cada história era acompanhada da inevitável risada, que até chamava a atenção da senhora secretária da Academia, que não as ouvia, mais percebia nós dois caindo em gargalhadas. Sempre dizia-me que aquele clima de esculhambação, sua esposa não aprovaria em seu apartamento e que por isto nossos encontros teria que ser sempre no térreo da casa de letras de Manoel Rodrigues de Melo. Quando chegava alguém amigo, o mesmo ia atender em sua mesa de presidente do Conselho de Cultura, mas quando se tratava de um daqueles tipos chatos, o mestre se sai com esta: “No momento estou ocupado com este jovem que veio aqui pesquisar sobre folclore”. E na saída do indesejado, haja risadas e cafés para comemorarmos a divina despedida.
Vivi era bacharel em Direito e talvez por isto sempre incentivara-me a fazer também um dia “o maior curso universitário”. Foi juiz municipal, professor universitário de etnografia e antropologia da UFRN, jornalista, compositor, pesquisador, folclorista e escritor. Boêmio e tocador de violão, me dizia rindo que tinham sido duas profissões boas do seu passado... e que tinha sido até guia do conhecido cego Raimundo.

Após a aposentadoria em 1989, dedicou-se mais a publicações de livros e artigos em jornais e revistas. Segundo confessava, a partir de então o folclore, tomou-lhe o tempo para seu prazer, não para ganhar dinheiro. Quase sempre o via abrindo sua caixa postal no Correio da rua Princesa Isabel e retirando dezenas de cartas e livros vindos de toda a parte do mundo. Parecendo ter bola de cristal em sua frente, dizia quando me via saindo do Correio com uma só carta na mão vindo da minha caixa: “Lá na frente quando seus cabelos caírem assim como os meus, você vai achar chato receber tanta carta sem tempo para respondê-las”. E parodiando aquela canção ataufiana – eu era anônimo e feliz e não sabia...

Faltando apenas quatro dias para o dia do folclore de 1996, o mestre Vivi partiu tão rápido com seu coração tão grande, com passo sempre ligeiro de quem era magro para as terras de São Saruê, onde as barrancas são de cuscuz e o rio é de leite. Terra de verdadeira amizade, bate papo, caju e... Tudo puro sem corantes e conservantes artificiais do século XXI...

Este ano minha filha mais velha Elaynne, formada em Letras na UFRN, passa no concurso para professores da rede municipal de ensino de Natal e começa a trabalhar justamente na Escola Municipal Veríssimo de Melo, no bairro de Felipe Camarão. E a citada professora de literatura e português que não teve o privilégio de ser amiga do mestre patrono de sua escola, como o seu pai, que além de amigo, foi também aluno da chamada Universidade espontânea do saber verissimoniano, me pede uma fotografia e livros do mestre Vivi para o acervo da sua escola. Na hora veio-me um impulso do coração, para ligar para Diógenes da Cunha Lima, grande amigo de Vivi, e pedir-lhe ajuda nesta ‘intriga do bem’ da educadora, e este atende-me de pronto, dizendo-me não se tratar de coincidência nenhuma, mas sim de um pedido do próprio Vivi a dois amigos.

Não querendo acreditar e nem desacreditar totalmente de nada nesta terra de tanta vã filosofia, faço como o mestre Vivi faria, dou uma risada, tomo um cafezinho e por não fumar cigarro, baforo um charuto para comemorar a aposição da fotografia do meu saudoso mestre no próximo dia 25 às 10 horas na referida escola, que com justiça homenageia esse grande homem que soube com maestria cultivar a amizade e respeitar o folclore.

Gutenberg Costa, pedagogo, folclorista, escritor e acadêmico do curso de Direito da Faculdade Câmara Cascudo (gutenbergcosta@bol.com.br)

Publicado no “O Jornal de Hoje” em 18 de agosto de 2009.

RESULTADO DO FESTIVAL DE OLÍMPIA EXPOSTO PELO PRESIDENTE DA CNF

Em Olímpia: capital brasileira do folclore

Belíssima cidade, localizada na região Norte do Estado de São Paulo, a 470km da capital, uma excelente qualidade de vida. Sua economia sustenta-se na plantação de cana de açúcar e laranja. Rico artesanato e variada gastronomia. Sem falar nas várias indústrias instaladas para o beneficiamento de sua matéria prima.
Naquela cidade realiza-se o mais importante festival folclórico do Brasil que alcançou a 45ª edição. Uma iniciativa do grande pesquisador, professor José Sant’anna e seu alunado, no antigo colégio Olímpia, onde lecionava. Foi se expandindo para outras escolas, estabelecimentos comerciais da cidade, até chegar à Praça São João Batista e se transformar num dos mais importantes festivais do País. A amiga Ana Maria Cascudo esteve no ano anterior proferindo palestra e pode muito bem atestar tudo que aqui relatamos.
Com o passar dos anos, a praça não mais comportava o evento, mudou-se para o Centro de Esportes e Recreação Olintho Zambom. Até ganhar recinto próprio. Um majestoso espaço que ostenta o nome de Praça de Atividades Folclóricas José Sant’anna.
Nos dias atuais, transformou-se num contexto massificado, cuja ordenação do discurso direciona-se para a divulgação da cultura popular brasileira. Este Festival é reconhecido como o maior e mais importante do Brasil, notabilizando-se por preservar, divulgar e celebrar de forma inteligente, real, e ao mesmo tempo espetacular, a diversidade cultura brasileira, proveniente de todas as regiões do país. Constando danças e autos folclóricos; cursos, palestras, seminário, mesas redondas, culinária brasileira, desfiles, espetáculo pirotécnico, artesanato de várias partes do Brasil, gincanas, oficinas de brinquedos, etc.
Este ano teve o apoio e reconhecimento do Ministério do Turismo como um dos três eventos do Estado de São Paulo, gerador de fluxo turístico e elevado conteúdo cultural.
Atualmente é reconhecida como a capital brasileira do folclore e, este ano, o Brasil e o mundo pôde acompanhar (on line), transmissão em tempo integral, de tudo que aconteceu na bela e espaçosa praça de eventos.
Lá estivemos levando nossa modesta contribuição, proferindo palestra, cuja temática versou sobre o Pastoril D. Joaquina, de São Gonçalo do Amarante, uma ação bem sucedida de recuperação. Lá estiveram representando nosso Estado com o apoio do prefeito Jaime Calado. Valeu prefeito! O Brasil lhe agradeceu e aplaudiu as pastorinhas da terra de D. Militana. Participamos ainda de uma mesa redonda com representantes do Sudeste, Sul e Norte, sob a temática: Massificação e Cultura Tradicional, numa perfeita interação com pesquisadores, professores, estudantes e estudiosos.
Participaram treze Estados, 90 grupos. Uma amostragem bastante significativa para que estudiosos de várias partes do país pudessem tirar suas dúvidas e conclusões de como o folclore consegue sobreviver num contexto massificado. O Sergipano Luiz Antônio Barreto, grande estudioso e teórico do Folclore, foi feliz e conclusivo ao afirmar: “o cotidiano é um grande espelho sobre o qual refletem todas as manifestações expressivas do povo, como práticas que o uso consagra e renova”.
Sabedores disso cantam e renovam seus cantos. “Sou lenda/ Sou linda/ Sou folclore/ Sou Olímpia/ Cheiro de Brasil/ Cor do Brasil”.

Severino Vicente
Presidente da Comissão Norte-rio-grandense de Folclore

Publicado no "O Jornal de Hoje".

Festival de Folclore de Olímpia

Eis aqui o resultado dos Seminários discutidos nesta cidade.

Seminário apresenta as experiências dos núcleos da Comissão Paulista de Folclore


A massificação da mídia na cultura tradicional, a prática do folclore na educação, as manifestações folclóricas existentes no município e as experiências dos núcleos Vale do Rio Grande e Pé de Serra, da Comissão Paulista de Folclore, encerram, na quarta-feira, 12, o ciclo de debates do Seminário de Folclore, realizado no Pavilhão Cultural do recinto da Praça das Atividades Folclóricas Professor José Sant’anna, inserido na programação do 45º Festival Nacional de Folclore de Olímpia (SP).


A coordenadora do Núcleo Pé de Serra, da região do município de (SP), Lilian Vogel mostrou as ações do núcleo materializadas no Encontro de Verônicas, Revelando São Paulo Entre Serras e Águas, Encontro de Congadas e o Fórum do Arco da Velha entre outras atividades. Demonstrou a necessidade do envolvimento do poder público com as iniciativas relacionadas à cultura tradicional e seu trabalho com as cinco congadas existentes em sua localidade. E a professora Neide Rodrigues Gomes, também coordenadora do núcleo e vice-presidente da Comissão Paulista de Folclore, explicou a importância da Comissão Nacional de Folclore e o pioneirismo da Paulista em criar os núcleos regionais permitindo a descentralização das ações para todo o Estado de São Paulo. Lembrou ainda as iniciativas Núcleo Pé de Serra que permitiram a reestruturação da festa do Divino Espírito Santo na região de Joanópolis (SP).


O trabalho Núcleo de Ação Cultural Vale do Rio Grande na região de Olímpia, coordenado por Rosiane Nunes e Antonio Scarpinetti,deu a dinâmica à primeira parte dos debates da manhã, reafirmando a importância de conhecer, respeitar, preservar e manter os saberes da cultura tradicional existentes na região do Vale do Rio Grande. Foram apresentado vídeos e o censo cultural “Manifestações Culturais de Olímpia: o anônimo se faz público”, realizado pelo Núcleo de Ação Cultural Vale do Rio Grande, em 2007, demonstrando um mapeamento dos grupos locais. O censo foi apresentado no 13º Congresso Brasileiro de Folclore, em Fortaleza (CE),em 2007, no 5º Seminário de Memória na Universidade Estadual de Campinas (SP) – Unicamp, em 2007, no 5º Seminário da Diversidade Cultural do Ministério da Cultura, dentro 4º Encontro Mestres do Mundo, em Juzeiro do Norte (CE), em 2008 e no 3º Encontro Anual do Núcleo de Estudos em História Oral – Neho/USP, 2008.


Também participaram os líderes de companhias de reis Valdevino Ambrósio, Pedro de Daco e o folião e congadeiro Everton D`Ávila, membros de honra do núcleo e titulados em janeiro de 2009 pela Comissão Paulista de Folclore, em evento realizado na Câmara Municipal, junto com mais de 100 pessoas que atuam com saberes tradicionais na região de Olímpia.


O trabalho do núcleo, apresentado aos professores da rede pública presentes no seminário, mostrou que centenas de pessoas estão envolvidas na cidade com as atividades do folclore durante o ano todo e não só na semana do festival. E a principal constatação foi a grande participação de crianças e jovens nos grupos folclóricos autênticos. Sem considerar os de projeção folclórica ou parafolclóricos, onde a juventude é entusiasta e predominante, além dos novos grupos surgidos nos dois últimos anos.


Nos grupos tradicionais os lideres, pais e familiares de foliões são os responsáveis por estimular a participação de seus filhos, netos e sobrinhos e assim, pela oralidade, transmitir os saberes de várias gerações. São os pequenos foliões, congadeiros e moçambiqueiros, que atraem a atenção de fotógrafos e cinegrafistas e do público, a frente das apresentações dessas manifestações. São a garantia da preservação dessas tradições. Muitos dos que hoje compõem os grupos em bairros mais periféricos, como a Vila São José, Cisoto e Jardim Santa Ifigênia, eram crianças quando essa preocupação já se manifestava nas origens do festival.

O professor Sant’anna, idealizador do festival, há muito estimulava a participação dos filhos dos foliões, como lembrou o professor, compositor e cantor, Vadão Marques. Mas as escolas, segundo ele explicou, cumprem também esse papel de conscientização em suas ações, promovendo atividades relacionadas às vivências do folclore nas escolas. Disse ainda que mesmo que os alunos da rede municipal não tenham participado da abertura do festival, foi intenso o envolvimento deles na confecção dos enfeites de flores, fitas e máscaras de folias de reis, os elementos simbólicos alusivos à temática do 45º Fefol que ornamentam o recinto das atividades folclóricas.

Disseram também que os líderes de grupos já visitaram as escolas, onde relataram suas experiências e vivências das manifestações tradicionais. Essas ações são uma das maneiras de valorizá-los e proporcionar atenção e o respeito de que são merecedores. Não só como cidadãos, mas como portadores de uma cultura imaterial de saberes de muitas gerações, representativas da nossa identidade cultural.

Na Escola Estadual Capitão Narciso Bertolino as professoras relataram que incentivam a participação dos alunos com montagens de congadas mirins e outras atividades ligadas à tradição. Conforme relatos dos professores, a educação colabora com a conscientização das crianças e jovens com a temática do folclore. Marileusa do Carmo, da Emei Thiago Felício de Sant’anna, no bairro Campo Belo, em Olímpia, explicou que essas atividades estão no eixo disciplinar da grade curricular e acontecem o ano inteiro. Entre os alunos estão também os filhos de mestres e foliões, onde se trabalha essa realidade, a alfabetização e a conscientização para o folclore. “Trabalhamos com a educação infantil e fazemos a reelaboração de brinquedos tradicionais e promovemos pesquisas deles com os pais. O que eles brincavam. Alfabetizar pelas advinhas, com cantigas de rodas”, disse a professora.

A catira feminina de Babaçu, desativada há alguns poucos anos, tem merecido a atenção das professoras do distrito e está entre os exemplos de como é possível fazer folclore em sala de aula. Iracema Ducatti Basseddo, diretora, e Hilda Rocha Pinheiro, da Escola Washington Junqueira Franco, recriam com suas alunas o tradicional folguedo, com a ajuda do violeiro e produtor de rodeios, José Aparecido Theodoro, conhecido por Zezão. Ele aprendeu a tocar e dançar a catira com seus pais e tios, desde a infância e repassou esses conhecimentos às filhas e sobrinhas da família. A sua catira que se apresentava em festas e rodeios era formada por um grupo de quatorze jovens e adolescentes, entre quais sua filha. Porém com o casamento de algumas meninas a dança foi extinta. As professoras acreditam que agora e como apoio de Zezão a catira volte a representar o distrito nas próximas edições do festival de folclore.


A participação do poder público apoiando essas manifestações é também fator preponderante na manutenção e continuidade dessas celebrações. A professora Cidinha Manzolli, coordenadora do festival, lembrou que a Escola Estadual Anita Costa, de Olímpia, já realizava o “revivendo São Paulo”, de representações da culinária tradicional e danças típicas de vários estados. Exemplo de como aproveitar os recursos disponíveis em favor da manifestação folclórica e do resgate da cultura dos estados brasileiros. “O professor é um formador de opinião. Temos de fazer nossa parte”, disse a professora.


Fonte: Núcleo de Ação Cultural Vale do Rio Grande, da Comissão Paulista de Folclore.

RETIRADO DE: folcloreolimpia.com.br/?pagina=noticias/id185

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

SEMINÁRIO DE FOLCLORE

Trata-se de uma série de palestras e seminários ministrados por renomados folclorólogos, para estudantes e pesquisadores, cujo objetivo é ampliar-lhes a cognição sobre o folclore. O evento será realizado no Pavilhão Cultural, de 10 a 12 de agosto, na Praça das Atividades Folclóricas, das 9 às 12 horas. A Coordenadoria dos Festivais de Folclore de Olímpia promove o evento. Nesta edição, além das explanações teóricas, que se darão no período da manhã, os participantes do ciclo de palestras terão atividades práticas à tarde. Haverá ainda participação de grupos folclóricos e parafolclóricos e certificados aos participantes.



PROGRAMAÇÃO


- Dia 11/ de Agosto – terça-feira

9:00hs - Palestra 3 – Documental – Registro da Comissão Piauiense de Folclore
Com performance do Grupo Congo de Oeiras

10:30hs - Palestra 4– Pastoril - uma ação bem sucedida de recuperação
Profº Severino Vicente
Presidente da Comissão Norte-Riograndense de Folclore
Com performance do Grupo de Pastoril

Dia 12/ de Agosto – quarta -feira

9:00hs - Comunicação 2– Comissão Paulista de Folclore- A importância dos Núcleos-
Experiência do Núcleo Pé de Serra – CPF (1º que foi criado)
Prof. Lílian Voguel
Coordenadora do Núcleo

Experiência do Núcleo de Ação Cultural Vale do Rio Grande- CPF
Antônio Scarpinetti
Rosiane Nunes
Coodenadores do Núcleo Vale do Rio Grande

10:30hs – Mesa Redonda – Festival Nacional de Folclore em Olímpia
- Massificação e Cultura tradicional - Embates
Profª Neide Rodrigues Gomes

Vice Presidenta da Comissão Paulista de Folclore

Profº Severino Vicente

Presidente da Comissão Norte-Riograndense de Folclore

Profª Cidinha Manzolli

Coordenadora do Festival Nacional de Folclore

Coordenação: Profª Neide Rodrigues Gomes
Presidenta da Comissão Paulista de Folclore

45º FESTIVAL NACIONAL DE FOLCLORE DE OLÍMPIA/SP

Desde domingo o Presidente da CNF, Severino Vicente, está na cidade paulista de Olímpia, no 45º Festival Nacional do Folclore (Fefol), realizado entre os dias 8 e 16 de agosto.

Levou consigo o Pastoril Dona Joaquina que se apresentou terça (11/08) pela manhã e chamou atenção de muitos. O grupo se apresentará novamente na sexta (14/08).


Retirado de: nominuto.com/vida/cultura/pastoril-de-sao-goncalo-do-amarante-representa-rn-em-fefol/35860/

Assista as apresentações ao vivo no site: www.folcloreolimpia.com.br

sexta-feira, 17 de julho de 2009

Artigo de Severino Vicente - Presidente da CNF

Publicado em 09 de julho de 2009 em "O Jornal de Hoje". Natal/RN.


Em São Gonçalo do Amarante: um novo olhar para o Folclore


Quando pensamos o folclore e seu vasto universo, nossos olhares se direcionam para os mestres e seus ricos saberes. Uma vivência do cotidiano mergulhado nas culturas nascidas e geradas pela família, amigos, em qualquer contexto social, onde as relações mais íntimas, contínuas e afetivas, se tornam o primeiro passo para a compreensão do povo em sua dinâmica vivencial, de forma criativa, lúdica e mágica, capaz de alimentar esperanças, expectativas e de unir suas raízes de forma intra-social, mas com a obrigação de respeitar e preservar. Nada é tão emocionante quanto ouvir as lembranças dos velhos brincantes que guardam em suas memórias um conhecimento milenar, repassado de geração a geração sem perder a essência, beleza e magia.

Essa força espiritual, fazendo os velhos mestres viverem alegremente mesmo sem possuírem o conforto ou os recursos necessários a uma vida digna, é a mesma que faz com que jovens respeitem as experiências de vida e, incitados pelo vigor da juventude, tracem e vivenciem esses repertórios, cujos mostruários expostos nos dá a mais completa visão dos rastros conservados pelo povo, respaldados na tradicionalidade, oralidade, perpetuidade sob um novo olhar, uma nova dinâmica cultural, como fazem as pastorinhas do pastoril de São Gonçalo e seu genial palhaço Alex, um verdadeiro maestro quando entra em cena.

Contudo, nada disto terá vida longa se não houver sensibilidade da sociedade, dos gestores públicos e privados quanto à preservação dessas manifestações da cultura popular. Em nosso Estado assumem uma posição de relevância por ser a terra de Luis da Câmara Cascudo, o mais importante estudioso do Brasil e um dos maiores do mundo, e que tem no mestre Deífilo Gurgel uma continuidade, orgulhando a todos nós seguidores de ambos.

O pastoril de São Gonçalo do Amarante tem uma tradição centenária, motivo de orgulho para seus habitantes quando é citado como possuidor de uma autenticidade ímpar que engrandece o folclore potiguar e brasileiro. Eis a razão dos nossos olhares se voltarem para o “Pastoril D. Joaquina”. Pois, o referido grupo tem desenvolvido um trabalho de releitura estética dos mais perfeitos dentre os existentes neste país, contribuindo para uma nova forma de estudar e ver o folclore numa sociedade em constantes e rápidas mudanças. A Comissão Norte-Rio-Grandense de Folclore, não só apóia como proclama esse importantíssimo trabalho realizado numa terra de santos e mártires.

Eis as razões do convite ao “Pastoril D. Joaquina”, formulado pelos organizadores do mais importante festival de folclore e cultura popular do Brasil, que já está em sua 45ª edição, na cidade de Olímpia/SP, a ser realizado de 08 a 16 de agosto de 2009.

No Festival já mencionado também recebi convite para ministrar palestra sobre o tema:O Pastoril do Rio Grande do Norte: sua evolução e dinâmica”. Baseado no trabalho que vem sendo realizado por esse grupo de jovens brincantes. Demonstraremos os vários momentos dessa recriação e evolução na vivência da tradição popular de São Gonçalo do Amarante.

Lembramos que nesse festival, nascido sob a inspiração do saudoso professor José Santana, se fará presente grandes nomes e estudiosos da cultura popular Brasileira. Um evento plural, uma experiência positiva que evolui ano a ano, alimentado do itinerário cultural folclórico brasileiro, um legado da mestiçagem que faz deste país uma referência para o mundo.

Artigo de Severino Vicente - Presidente da CNF

Publicado em 16 de julho de 2009 em "O Jornal de Hoje". Natal/RN.

A Cultura Brasileira: uma realidade plural


Do século XIX em diante passamos a vivenciar notáveis avanços com a valorização de idéias e novas conceituações das coisas do Brasil. Essa preocupação, esse novo momento, pode ser considerada como fase de inspiração no campo da pesquisa para um domínio do conhecimento, elucidando problemas e questões inerentes à cultura Brasileira.

Começam a surgir trabalhos de natureza política, sociológica, econômica, antropológica, literária e científica. É o período dos viajantes estrangeiros e dos mais importantes nomes que consolidaram o mundo cultural dos brasileiros.

Nas duas últimas décadas do século passado fomos atacados por novos padrões e paradigmas, cujos efeitos e reflexos talvez nenhuma sociedade no planeta haja escapado. Mesmo as que por questões ideológicas ou culturais resistam em se opor à nova ordem, com todas suas práticas. Um poderoso fenômeno que chamam de globalização, mais que uma experiência, uma condição de vida, inexorável e irreversível pelas nações em todo planeta.

A inserção do Brasil nesse cenário é uma realidade já que integramos o segmento dos países emergentes. Em função dessa ordem de coisas precisamos aprofundar nossas pesquisas e estudos para sabermos fazer a diferença e não ficarmos rendidos no altar da globalização. Essa é a questão: conhecer ou não conhecer a real cultura brasileira.

Folclore, cultura popular, cultura erudita e identidade cultural estão na mesma condição. Notadamente, num mundo em que a cultura de massa domina todo o cenário, pois, esta, absorve aquela realidade plural e apóia-se num corpo de símbolos, mitos e imagens bastante identificados com a vida prática das massas urbanas, de forma cosmopolita e planetária, atuando em contextos pluriculturais.

A cultura de massa produz um universo muito vasto, que abrange todos os setores da moda, incluindo o lazer, esportes, cinema, arte, música, a imprensa escrita e falada, a literatura, enfim, tudo o que diz respeito à contemporaneidade.

E a cultura popular? Elemento essencial para compreender o povo e suas vivências religiosas ou profanas, tradicional e inovadora ao mesmo tempo, sem perder a essência e a fidelidade às suas raízes, é o grande laboratório nos dias atuais, com suas festas tradicionais transformadas em mega espetáculos, mormente para atrair turistas

Impossível fugir essa dura realidade, porque a regra é geral: têm que se vender de tudo, desde ideologias, visões de mundo e idéias até desejos e emoções.

Muitos são os exemplos, inclusive no Rio Grande do Norte, mas, vou dar como testemunho o “Maior São João do Mundo” na cidade de Campina Grande. Uma festa que acontece durante todo mês de junho. Uma repartição de tempo ditada e negociada. Discurso construtivo que combinam imagens, símbolos, ícones globais e locais.

Naquele espaço global, as matrizes da cultura popular nordestina são submetidas às estratégias de reconvenção comunicativa, econômica e simbólica para atender a um mercado massificado.

Ao entramos vemos logo uma fogueira que muda de cor, controlada por computadores. É o maior São João do mundo e, se fizermos uma boa leitura intelectual, concluímos que em toda aquela engrenagem existe um sentido de pertencer a algum lugar, algum mundo. O mundo dos nordestinos.


segunda-feira, 15 de junho de 2009

Artigo de Gutemberg Costa - Vice-Presidente da CNF

Publicado em 12 de junho de 2009 em "O Jornal de Hoje". Natal/RN.

Menos um mestre da sabedoria entre nós

Gutenberg Costa, folclorista, pedagogo e vice-presidente da Comissão Norte-rio-grandense de Folclore (macandmac@bol.com.br)

Quando se vai um mestre, aquele que verdadeiramente tem o que ensinarmos, ficamos cada vez mais pobres e órfãos de seus sábios saberes e fazeres. Éramos amigos, irmãos caçulas e filhos adotados. Estivemos tantas vezes perto de sua alegria quando estavas dançando o seu ritual dos Congos e da mesma forma nos momentos de tristezas, diante de seus desabafos inerentes a quem opta por vivenciar o folclore de corpo e alma num País sem valorização de sua cultura popular.

Quanto se paga a uma banda dessas existentes que se apresentam apenas por um dia? E quanto se paga aos grupos folclóricos que vivem entre nós há décadas? Quantas autoridades acompanharam a sua ida ao cemitério? Um dos maiores que a Vila Ponta Negra já viu. Povo chorando. Povo vestido de seus grupos folclóricos. Povo aplaudindo-o! E até quando será perpetuada a funesta máxima de que santo de casa não obra milagres?

Somos todos os culpados, segundo já dizia o grande Darci Ribeiro. Cada um a sua maneira que faça um exame de consciência, para medir o peso de sua culpa em relação ao descaso com esses geniais mestres! As universidades têm graduações para quase tudo, é claro nas quais os graduados ganhem dinheiro. Mas me digam senhores reitores, quem de bom juízo quer ser um 'folclorista' num mundo globalizado em que o dinheiro está acima de tudo e de todos? Quantos milhões deixam para seus herdeiros os que abraçam o gosto e o desgosto do nosso folclore? Suas ações são aplicadas em amizade, respeito, alegria, simplicidade e amor à cultura genuína do seu povo! Seu espólio ficará entre nós, os brincantes e os apreciadores de seu Congo de Calçola de Ponta Negra. O cheque em branco que você, mestre José Correia, deixou no banco da vida, foram os milhões de bondade como o grande legado para todos nós. Suas riquezas culturais e valores pessoais poucos neste mundo podem deixar!

Querido mestre, nossa Comissão Norte Rio Grandense, com 60 anos, fundada por Câmara Cascudo e outros valorosos mestres, não dispõe de um centavo em caixa para comprar-mos coroas fúnebres. Nossas homenagens costumam ser em vida! Dispomos sim, de solidariedade e respeito aos mestres de grupos folclóricos no dia-a dia. Esse é o decreto número um, ensinado pelo nosso professor Deífilo Gurgel. Segundo a escola 'deifiliana' ao modo de Platão e Sócrates, é preciso ter amor à cultura popular e desapego ao dinheiro, para ser um autêntico folclorista. Talvez por isto, é que sejamos tão poucos neste universo tão capitalista do século XXI. Uma 'era' que ainda teima em 'matar' os seus mestres, da mais cruel forma hitleliana, ou seja, de ostracismo cultural. Isso é, quando estes são relegados ao esquecimento por todos nós e principalmente pelo poder público, que é quem os deveria assistir com dignidade em vida. Nem é necessário dizer que cada vez que um grupo folclórico é propositalmente deixado sem apresentação, concorre-se para a morte de seus lideres. E isso infelizmente ainda ocorre cotidianamente por esse Brasil afora...

E como filosofava minha saudosa mãe dona Estela, quando tomava conhecimento da partida para a última das viagens de alguém: Dessa vida nada se leva e só se deixa à bondade e a amizade... Fique certo mestre Zé Correia, que tanto à bondade quanto à amizade, você deixou espalhada como semente para ser plantada e cultivada por nós, os seus amigos, amigos do seu Congo e amigos sinceros de todas as horas que lutam na trincheira do rico Folclore potiguar, que hoje fica mais pobre com sua partida.

Nosso admirado amigo Zé Correia – fique na santa paz do folclore e que sejas recebido com alegria por nosso Deus, o verdadeiro Mestre dos Congos.

terça-feira, 9 de junho de 2009

Pela cultura do bem e contra a cultura "de espantalhos"

Sérgio Henrique. Publicado no Dia 07/06/2009


Foto: Alberto Leandro

Recém-empossado na presidência da Comissão Norte-rio-grandense de folclore, o historiador e antropólogo Severino Vicente está à frente da entidade não governamental que discute os rumos das manifestações folclóricas do nosso Estado.

Fundada em 3 de abril de 1948, a CNF é renovada de quatro em quatro anos. Entre seus ex-presidentes estão Manoel Rodrigues Melo, Hélio Galvão, Veríssimo de Melo, Deífilo Gurgel e Iaperi Araújo. A eleição é feita reunindo sócios efetivos da Comissão no RN, e em Assembleia Geral Ordinária são eleitos o presidente e toda a diretoria. Severino foi aclamado ao cargo, já que era vice-presidente de Iaperi.

Nesta entrevista, o novo presidente fala sobre a identidade folclórica do Rio Grande do Norte, a necessidade de sua valorização, a luta dos grupos folclóricos do Estado e as irresponsabilidades de quem promove espetáculos para vender eventos culturais como um negócio.

CORREIO DA TARDE - Como o Sr. define o folclore?

Severino Vicente - O conceito de folclore não foi definido por mim, mas por uma comissão reunida no 8º Congresso Brasileiro de Folclore, realizado em Salvador/BA. Na ocasião, as discussões com representantes da UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) e do IBEC (Instituto Brasileiro de Educação, Cultura e Turismo) fizeram uma releitura da carta elaborada no I Congresso Brasileiro de Folclore, realizado no Rio de Janeiro em 1951. Esta nova conceituação define folclore como sendo o conjunto de criações culturais de uma comunidade, baseado nas tradições de expressões individuais e coletivas, que representem sua identidade social. O folclore é também caracterizado pelo respaldo na aceitação coletiva, na tradicionalidade, dinamicidade e funcionalidade.

Quais serão suas primeiras medidas à frente da CNF?

Criar um site da Comissão. Neste site vamos convocar a comunidade e os estudantes de escolas públicas e privadas a participar de um momento de reestudo e reavaliação da cultura potiguar. Vamos procurar interagir com as universidades, entidades de educação, secretarias municipais e estaduais de cultura. A cultura é importante para que o jovem participe de outras formas de vivência, saindo do padrão quadro e giz. As portas devem estar abertas à cultura do bem.

Cultura do bem?

Isso. A cultura que é feita para educar as pessoas, e não para iludir as massas. O que ocorre muitas vezes em algumas cidades do nosso Estado e em vários locais do país é uma verdadeira cultura de espantalhos. Pessoas, prefeituras e órgãos estatais querem chocar e não se preocupam em deixar uma leitura educacional e cultural para os espectadores. Por exemplo, é inconcebível espetáculos como o que presenciei há alguns anos, mostrar erros históricos como colocar Maria Bonita invadindo Mossoró com o bando de Lampião em 1927, sendo que eles só se conheceram anos depois. Para mim, qualquer apresentação que não tiver uma leitura prévia não é útil à sociedade. Não sou contra nada disto. Apenas sou contra o uso do dinheiro público para promover eventos que promovam esta cultura de espantalhos.

O Sr. é historiador e antropólogo. Considera sua formação importante para a consolidação de um plano abrangente para incentivo aos grupos folclóricos no RN?

Minha formação me dá condições de ter uma visão geral da ciência do folclore. Aqui no Estado, ainda se trabalha um conceito antigo, de 1846, concebido na Inglaterra, a ideia de significação dos termos "folk" e "lore". Hoje em dia, não podemos regredir e nos limitarmos a ver somente isto como folclore. Temos que ver o folclore como qualquer outra ciência, que tende a acompanhar mudanças e transformações do mundo moderno. O folclore não é um museu à moda antiga. Pode ser um museu, mas um museu moderno.

Porque diversos grupos de folclore estão parados, como o Caboclinho (Ceará-Mirim), Marujada (Sen. Georgino Avelino) e Manelopau (Dr. Severiano Melo)?

Por falta de uma política cultural direcionada à preservação dessas manifestações populares. Muitos grupos ativos não têm estima elevada. É importante não só dar dinheiro, mas incentivá-los para que apresentem a sua arte, sobretudo nas escolas e em eventos oficiais. Em minha opinião, todo evento do Governo deveria ter apresentações folclóricas e de grupos parafolclóricos.

O Sr. critica o governo. É contra a política cultural do governo Wilma?

Não faço oposição ao governo, afinal somos uma ONG que apenas tem uma sala na Fundação José Augusto. Procuro apenas abrir as portas para dizer que estamos ao lado dos grupos folclóricos. Por isto precisamos do governo.

Diversos grupos folclóricos do nosso Estado estão em vias de acabar. Qual a expectativa com relação à política de editais das fundações culturais do Estado (FJA) e município (Funcarte)?

Estes grupos estão para acabar por falta de incentivo e de apoio. Eu acho boas ideias o lançamento de editais culturais. Mas não acredito que vá funcionar porque como já falei, não adianta dar dinheiro. É necessário que haja valorização dos folguedos, para que eles não percam a sua essência.

É verdade que vários grupos e mestres são prejudicados pelo processo burocrático das inscrições nestes editais?

Infelizmente é verdade. Inclusive orientei a Fundação José Augusto a colocar pessoas para ajudar no preenchimento dos formulários de inscrição. Muitos nem sabem da existência dos projetos. Vários, inclusive, não sabem ler. Se pensarmos positivo e fizermos com que os investimentos e a valorização se concretizem, estaremos proporcionando ao RN o terceiro grande momento do folclore potiguar.

Terceiro? Quais foram os outros?

O primeiro foi a vinda de Mário de Andrade, entre 1928 e 1929. Ele e Cascudo fizeram aqui em Natal a primeira classificação das manifestações folclóricas brasileiras. O segundo foi a administração do ex-prefeito Djalma Maranhão, que teve como base de sustentação de seu governo a cultura do povo.

As pessoas do nosso Estado valorizam nossa cultura?

Temos vários grupos folclóricos que encantam o Brasil inteiro. O Boi de Reis de Pedro Velho, por exemplo, esteve em Olinda, Guarujá/SP e Minas Gerais e as pessoas gostaram muito. O Caboclinhos de Ceará-Mirim é outro grupo que vai fazer apresentações pelo Brasil inteiro. O Congresso Brasileiro de Folclore, que reúne estudiosos de todo o mundo, pediu que levássemos a Chegança e o Fandango. Enfim, nossas manifestações só não encantam o RN. Até Mário de Andrade se encantou com a cultura do Estado, quando esteve 45 dias com Cascudo aqui em Natal. Muitas vezes falta que o próprio norte-rio-grandense dê valor ao que é da terra.

Já que tem pessoas que não valorizam, podemos dizer que nem mesmo sabem o que é o nosso folclore. Afinal, o que forma o folclore potiguar?

As danças. Nossas danças folclóricas são as mais belas, autênticas, legítimas e originais do folclore brasileiro. Não existe em todo o país um Boi de Reis, um Araruna, Fandango e Chegança iguais aos do nosso Estado. Manifestações puras, com as características originais, só no RN. Este é o nosso diferencial.

Fonte: http://www.correiodatarde.com.br/editorias/cultura-43835

Folclore potiguar precisa de mais atenção



Daniela Pacheco - Editora de Cultura, publicado em 05 de junho de 2009

Os historiadores Severino Vicente e Gutemberg Costa assumiram no mês passado a presidência e vice-presidência da Comissão Norte-Riograndense de Folclore. Instituição que foi criada por Câmara Cascudo há 60 anos e que tem a responsabilidade de estudar, preservar, divulgar, promover e valorizar a cultura popular do Estado. O JORNAL DE HOJE conversou com eles sobre o folclore potiguar. Confira!

O Jornal de Hoje - Por que o Rio Grande do Norte é importante para o contexto cultural do Brasil?

Severino Vicente – O Rio Grande do Norte é um dos estados brasileiros mais privilegiados quanto à diversidade e conteúdo de cultura popular. Em primeiro lugar, é a terra de Câmara Cascudo, considerada por muitos dos seus contemporâneos um dos maiores folcloristas do Brasil. Outro ponto é que o nosso Estado é o único do Brasil que ainda mantém vivo quatro grandes autos populares, que são: Boi de Reis, Fandango, Chegança e Congo. Sem falar nas danças tradicionais. Em terceiro lugar, no final dos anos 20, o Rio Grande do Norte recebeu o escritor Mário de Andrade que junto com Cascudo realizou a primeira classificação sobre os nossos autos e danças folclóricas. Sem contar os nossos mestres e gênios da cultura popular.

O Jornal de Hoje – O senhor poderia citar alguns nomes?

Severino Vicente - Muitos... O Rio Grande do Norte é conhecido por ser o berço do maior embolador do Brasil que foi Chico Antônio, esse mestre foi personagem de inúmeros livros, musicas, artigos de jornais e revistas, entre outros. Temos Chico Daniel que foi um dos maiores mamulengueiros do país. A maior romanceira Dona Militana, que dos 54 romances da península ibérica que estam documentados, ela conta 34. Outro nome importante é o de Mestre Cornélio que salvou o mais importante patrimônio estético da cultura nordestina medieval – o araruna. Por tudo isso, é que a cultura popular do nosso Estado tem que ser valorizado.

O Jornal de Hoje – O senhor acha que a cultura popular potiguar não é valorizada?

Severino Vicente - Valorizada? Pelo contrario. Não existe um projeto direcionado para o patrimônio popular do Rio Grande do Norte. Os gestores públicos são sugestionados quando a mídia divulga alguma coisa.Eles correm para cima. Só querem tirar partido do artista.

O Jornal de Hoje – Como assim, tirar partido do artista?

Severino Vicente - Esquecem que o artista é uma pessoa. E, que precisa comer, morar... E, principalmente, precisam ter mais espaço e oportunidades para apresentar a sua arte. Eles (os artistas) estam perdendo a estima porque não são convidados para se apresentarem em lugar nenhum.

O Jornal de Hoje – Os senhores podem citar algum exemplo?

Severino Vicente - Claro! Por exemplo, o Araruna que esteve a pouco tempo na mídia, depois da morte de seu Cornélio não fez mais nenhuma apresentação. Essa informação partiu da diretoria numa reunião com a Comissão. Outro caso, é do filho de Chico Daniel, com o pai ele aprendeu a arte dos mamulengos, que terminou por encostar a mala de bonecos num canto qualquer e foi trabalhar como ajudante de pedreiro em Itajá. Não podemos esquecer de falar do mestre dos Congos, José dos Santos Correia que se encontra sem nenhum amparo muito doente no hospital Walfredo Gurgel. E, a comissão não tem recursos financeiros para ajudá-lo.

O Jornal de Hoje – Então, deveria ter um apoio maior dos gestores públicos ao que se refere a valorização da cultura e dos artistas que fazem a cultura popular do Rio Grande do Norte?

Gutemberg Costa – Com certeza! A comissão Norte-Riograndense de Folclore está aberta para dialogar com ele. É importante que as manifestações do folclore sejam equiparadas às demais formas de expressão cultural, bem como seus estudos aos demais ramo das humanidades conseqüentemente deve ter o mesmo acesso, de pleno direito, aos incentivos públicos e privados concedidos à cultura em geral e às atividades científicas através da pesquisa, ensino-educação, turismo, atividades parafolclóricas, comunicação de massa, publicações, intercâmbio, hierarquias.

O Jornal de Hoje - E, tem algum projeto de incentivo cultural em desenvolvimento na esfera política que os senhores apostam?

Gutemberg Costa – A comissão está ansiosa para ver posto em prática o RPV, a Lei de Registro do Patrimônio Vivo que é um espécie de bolsa salário que não resolverá em curto prazo. Mas, acreditamos que em médio já começará afazer efeito. O problema é que tem de ser aplicada o mais rápido possível, pelo simples fato que se demorar muito, os beneficiados, no caso, os mestres da cultura potiguar que já estam em idade avançada não estarão vivos para serem beneficiados. Mas, é importante lembrar que incentivar não é só dar roupa ou salário. Tem que dar oportunidade de gerar apresentações e não deixar cair no ostracismo cultural que se encontra o folclore potiguar na atualidade.


Fonte: http://www.jornaldehoje.com.br/portal/noticia.php?id=16501

Discurso de posse proferido no auditório Robson Faria, Assembléia Legislativa do RN, 20/05/2009

PORQUE ESTAMOS AQUI

Para salvaguardarmos a cultura popular potiguar, parte integrante do legado cultural brasileiro, nascido da utopia dos descobrimentos, modelados pelos ensinamentos cristãos, com a água e pó sal do batismo, o madeiro sagrado, a escolha de santos como padroeiros, capelas e templos nos engenhos e fazendas de gado uma vida que girava entre o sagrado e o profano, a fé e o pecado, devendo obediência aos senhores de terras, instalados em casarões fortificados, armados e municiados, numa sintonia quase perfeita com padres santos, rosários, terços e novenas em nome da fé.
Nenhuma sociedade no mundo foi formada com esse quadro genético, eis a razão de sermos diferenciados e termos a mais rica diversidade cultural do planeta.
O processo da globalização, com suas constantes e rápidas mudanças, traz em seu contexto uma produção conflitante com nossa realidade sócio-cultural, um momento da vida brasileira que preocupa os estudiosos da folclorística.
Sabemos muito bem que como todas as demais ciências, o folclore também acompanha o processo de mudanças evidenciadas por um mundo em transformação. Ocupa novos espaços, em qualquer contexto social, por mais complexo que seja o estágio cultural de seus componentes, ao nível de produção, adoção ou ainda de consumo dirigido. Mas sabemos muito mais que é preciso estudá-lo, conhecê-lo, porque ele é a ciência de salvaguarda da cultura popular em qualquer parte do mundo. No caso Brasil, sobretudo o Nordeste, em particular o Rio Grande do Norte, o folclore é um documento que precisa ser respeitado e preservado para evitar o uso equivocado, com paradigmas estereotipados não condizentes aos princípios fundamentais de uma ciência tão complexa e importante que de um lado perfila, com suas justas aspirações na busca da preservação da identidade nacional e, do outro, associa os fatos da história cotidiana no processo de afirmação social. Nós brasileiros temos, que fazer a opção entre preservar, defender e divulgar este rico e fabuloso patrimônio estético ou vê-lo aprisionado no altar da globalização
Nos dias atuais, o folclore não pode, nem deve ficar preso aos pontos básicos pelo qual foi visto durante muito tempo, quais sejam: anonimato, persistência, antiguidade e oralidade. Ainda que esses aspectos de forma insofismável permaneçam sendo os pilares que sustentaram a base de todo os estudos da hoje reconhecida Ciência do Folclore.
Foi abolida a clássica definição do folclore, entendido como complexo das classes subalternas e instrumentais, que se contrapunha às classes oficiais, eruditas, hegemônicas e dominantes. Precisamos apenas entender: que vida, que povo, que classes, de que forma e em que circunstância foi e é desenvolvido o fato folclórico.
Não é mais aceitável o tradicionalíssimo conceito da carta de Willian John Thoms (1803-1855), Folk (povo), Lore (saber), oriundo do antigo inglês falado na Inglaterra.
Atualmente o folclore passa por uma releitura, com nova conceituação, visibilidade e dinâmica, aos direcionamentos que deve interagir como instrumento de salvaguarda da cultura brasileira, que guarda ainda um rico acervo da cultura medieval, sem ter vivenciado a Idade Média. Nenhum país no mundo detém tão rico acervo, daí a preocupação dos estudiosos para que a sociedade brasileira tome conhecimento desse fato e passe a valorizar esse rico mosaico de cultura popular não existente em nenhuma parte do planeta.
Em 1995, durante a realização do VIII Congresso Brasileiro de Folclore, realizado na cidade de Salvador, Bahia, ao qual a Comissão Norte-rio-grandense de Folclore esteve presente, reuniram-se os mais expressivos estudiosos da ciência de Thoms. Nessa oportunidade procederam a releitura da Carta do Folclore Brasileiro, aprovada no I Congresso, realizado no Rio de Janeiro, de 22 a 31 de agosto de 1951.
Esta releitura, ditada pelas transformações de uma sociedade em mudança e pelo progresso das Ciências Humanas e Sociais teve ampla participação de estudiosos dos diversos pontos do país, e também de representantes da UNESCO, apresentando suas recomendações sobre a salvaguarda do folclore por ocasião da 25ª Reunião da Conferência Geral, realizada em Paris, em 1989 e publicada no Boletim nº 13 da Comissão Nacional de Folclore, janeiro/ abril de l993.
Na nova Carta do folclore Brasileiro está explícita a moderna conceituação de folclore, como sendo: “o conjunto das criações culturais de uma comunidade, baseado nas suas tradições, expressas individual ou coletivamente, representativo de sua identidade social, respaldado na aceitação coletiva, tradicionalidade, dinamicidade e funcionalidade”. Folclore e cultura popular são equivalentes, como preconiza as recomendações da UNESCO, contudo a cultura popular permanece no singular como única e legítima, embora existam tantas culturas, quanto sejam os grupos que a produzam, em contextos naturais diferentes, específicos.
Os estudos de folclore, como parte integrante das Ciências Humanas e Sociais, devem ser realizados de acordo com metodologias próprias dessas Ciências.
Sendo parte integrante da cultura nacional, as manifestações do folclore são equiparadas às demais formas de expressão cultural, bem como seus estudos aos demais ramos das humanidades, conseqüentemente deve ter o mesmo acesso, de pleno direito, aos incentivos públicos e privados concedidos à cultura em geral e às atividades científicas através da pesquisa, ensino-educação, turismo, atividades parafolclóricas, comunicação de massa, publicações, intercâmbio, hierarquias.

Severino Vicente – Presidente da Comissão Norte-Riograndense de Folclore